Dark Kitchens – Um Dia na Vida dos Trabalhadores de Cozinhas Fantasmas

A rotina em uma das maiores redes de dark kitchens do Brasil é um microcosmo da metrópole, onde diferentes histórias de vida se cruzam. Acompanhe um dia típico nesse ambiente, que reflete os desafios e aspirações dos trabalhadores que tornam possíveis nossas refeições via delivery.

A Chegada e a Limpeza Inicial

A rotina começa às 9h com a limpeza geral. Lucimara, uma líder de cozinha de 30 anos, inicia os trabalhos. Moradora do Capão Redondo, em dias que dobra o turno, sai de casa às 7h e só volta depois das 23h. Seu sonho é ter uma casa própria, e o dinheiro extra do trabalho a ajuda nesse objetivo.

Preparação para os Pedidos

Os pedidos começam a chegar ao meio-dia e são recebidos pela gerente, Maria de Fátima. Paulistana, é ela quem abre o sistema no computador, faz o controle dos estoques e a ponte entre a cozinha e os motoboys. Ao contrário do que acontece em restaurantes tradicionais, onde o burburinho toma conta do salão, o silêncio predomina em uma dark kitchen.

O Trabalho na Cozinha

Márcio, auxiliar de cozinha de 26 anos, é um dos que empana e frita as carnes, a batata, a polenta e a mandioca usadas para compor os pratos. Irmão de Lucimara, começou como motoboy. Quando surgiu uma vaga da porta para dentro, viu a chance de guardar dinheiro para montar um segundo salão com a mulher, no Capão Redondo.

Os Horários de Pico

Em dias de trabalho normal, as vendas oscilam de 30 a 100 refeições. Em datas especiais, como Black Friday, podem chegar ao dobro. ‘É uma loucura. O pessoal do segundo turno chega e a gente ainda está terminando os pedidos do almoço’, diz Lucimara.

A Entrega dos Pedidos

Uma vez que as refeições estão prontas, elas são finalizadas para entrega. Completas e embaladas, são deixadas no largo parapeito da janela. No parapeito também está a campainha acionada por Fátima para avisar um dos motoboys, do lado de fora, sobre a nova entrega.

O Intervalo e a Preparação para o Segundo Turno

Passado o horário de pico do almoço, os pedidos rareiam, mas o trabalho não para. Há compras para subir ao estoque, molhos a preparar, carne para guardar e marinar… Só depois a equipe almoça, por volta das 15h30. Quase sempre a comida é a do próprio restaurante. ‘Mas às vezes a gente traz de casa ou pede fora, para dar uma variada’, diz Márcio. É quando ele tem tempo de assistir ao vídeo do filho, de dois anos, jogando bola na sala de casa.

O Segundo Turno

Para o segundo turno, a rotina é ainda mais agitada. O número de pedidos costuma ser maior, diz Kaio, um dos ajudantes de cozinha que trabalham à noite, na mesma unidade. Goiano, pai de duas crianças, Kaio conta que quer mesmo é ir morar em Portugal e ser fotógrafo de moda.

Os Planos para o Futuro

José Adilson, auxiliar de cozinha de 58 anos, tem outras preocupações. O alagoano chegou a São Paulo em 1989 com emprego garantido ‘na firma de pintura de um parente’ e, de lá, saiu para trabalhar em restaurantes tradicionais de comida árabe. Sua preocupação maior hoje é tocar as obras da ‘casinha lá no norte’, em Arapiraca, sua cidade natal, para descansar na aposentadoria.

O Fim do Expediente

O expediente vai se aproximando do fim por volta das 23 horas. Mas o motoboy João Paulo, de 30 anos, ainda tem as últimas entregas a fazer. Fora dos horários de pico, ele trabalha para aplicativos de entrega. ‘Aqui é bom, porque temos comida, água e banheiro disponível. Mas os aplicativos rendem mais’.

Reflexões Finais

Nas paredes, frases coladas por Lucimara lembram que, longe do hype da tecnologia que embala as startups dos aplicativos, manter a cabeça erguida e sonhar ajudam a encarar a rotina.

A dark kitchen é um lugar onde sonhos são construídos, onde cada trabalhador busca um futuro melhor através de seu trabalho duro. À medida que pedimos nossa próxima refeição via aplicativo, é importante lembrar das pessoas que tornam isso possível.

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